Que palavras usar para definir Agostinho da Silva? Um sábio, um filósofo, um génio, um contador de histórias, um conversador...
Uma pequena mas mais que merecida homenagem a uma pessoa tão mal conhecida entre nós que partilhamos a mesma alma lusitana.
Os grandes forjam-se na adversidade
Todo o ambiente é favorável ao forte; de um modo ou de outro ele o ajuda a cumprir a missão que se impôs e a conseguir ir porventura mais além das barreiras marcadas. A derrota deve mais atribuir-se à invalidez do impulso interior do que aos obstáculos que lhe ponham diante, mais à alma incapaz de se bater com vigor e tenazmente do que às resistências, às invejas e às dificuldades que o mundo possa levantar perante Hércules que luta.
O mal que se vê é aguilhão para o bem que se deseja; e quanto mais duro, quanto mais agressivo, se bate em peito de aço, tanto mais valioso auxiliar num caminho de progresso; o querer se apura, a visão do futuro nos surge mais intensa a cada golpe novo; o contentamente e a mansa quietude são estufa para homens; por aí se habituaram a ser escravos de outros homens, ou da cega Natureza; e eu quero a terra povoada de rijos corações que seguem os calmos pensamentos e a mais nada se curvam.
Mais custa quebrar rochar do que escavar a terra; mais sólido, porém, o edifício que nela se firmou. A grandeza da obra é quase sempre devida à dificuldade que se encontra nos meios a empregar, à indiferença que cerra os ouvidos do povo, e aos mil braços que logo se levantam para deter o arquitecto. Se cai em batalha, pobre dele, podemos lamentá-lo; não o chamara o Senhor para as grandes empresas; mas se pelo menos a voz se lhe erguer clara, firme, heróica no meio do turbilhão, não foram inúteis as dores e os esforços: algum dia um novo mundo se erguerá das brumas e o terá como profeta.
Quem ia a perturbar ficará perturbado, quem ia a matar ficará morto. Não é com os mesquinhos artifícios, nem com o desprezo, nem com a mentira, nem pelo cansaço, nem pela opressão, nem pela miséria que se vencem os que pensaram num futuro e, amorosamente, com cuidados de artista, continuamente, com firmeza de atleta, o vão erguendo pedra a pedra. É necessário que se resista enquanto houver um fôlego de vida, mas que essa resistência seja sobretudo o contacto com a realidade da força criadora; é esta que afinal tudo leva de vencida e reduz oposições a pó inútil e ligeiro.
Agostinho da Silva, in 'Textos e Ensaios Filosóficos
Apesar de não ser apreciador de Agostinho, tenho gosto em lê-lo e em ouvi-lo. Lembro-me das Conversas Vadias. Mas o que mais me admirou nesta nossa personagem foi o desassombro com que encarava o poder político, artístico ou económico: com enorme desdém. Porquê? Por que conquistou legitimidade para o fazer. Há certas pessoas que, em virtude da inteligência e do trabalho, conquistam um lugar no mundo. sabe que Agostinho não tinha BI?
ResponderEliminarContinue com os seu bom gosto.
Não imaginava que Agostinho não tinha BI.
ResponderEliminarRelativamente à personagem, confesso que não conheço tão bem quanto o António. Sei apenas que é uma pessoa que gosto volta e meia de ver e ler.
Obrigada mais uma vez.